A Turbulência dos teus Cabelos

Sempre assim os conheci, e assim sempre serão, os teus cabelos traquinas que brincam ao vento. Conheci-te num dia assim, ventoso, e logo vi que os teus cabelos eram como o estado do tempo que se fazia sentir. Esvoaçam e enrolam-se uns nos outros, são amigos e confidentes, e quase que troçam de mim, por estar envergonhado ao olhá-los. Bem os posso imaginar a contorcerem-se ao vento turbulento cheios de malícia, dizendo:
"Ele está a corar, vamos rir-nos dele!"; e assim o fazem girando ao vento os teus cabelos cor de amora. Nesse primeiro dia em que os vi, travessos e irrequietos, soube que a tua alma assim o era: uma alma desordeira. Desordenou o meu coração e desordena-te os cabelos agitados; não é o vento afinal, é essa alma cheia de energia de viver.
  Na nossa adolescência, por fim, viajámos pelo mundo do amor. A tua alma desordeira assim o continuou, e os teus cabelos para sempre entrelaçados pelo vento que passou. Essas ondas mágicas onde mergulho o meu nariz quando te abraço, são ondas frescas que me arrefecem nos mais quentes dias.
  Essa tua alma barulhenta deu som aos meus dias: até ao último dia da minha vida. E, nesse dia, parecias jovem como antes. Abracei-te naquele instante, tentando prender-te a este mundo. Os teus cabelos lutavam por ficar, comandados pela tua alma desordeira; estes dançavam como amantes e parecia que iriam durar a vida inteira! Os teus olhos fechavam-se, já cansados da vida, e os teus cabelos bailavam, como se fizessem entre eles uma corrida.
  E assim me deixei estar, a olhar para os teus cabelos irrequietos. Mexiam como se o metro por eles estivesse a passar. Mas o metro parou na sua paragem e os teus cabelos começaram a acalmar, devagar, como uma pequena onda já sem força para dançar.


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