Restava no ar o silêncio
Restava
no ar o silêncio da rua e caminhamos sem destino certo.
Olhamos de
frente para o sol que nasce, sem desviar o olhar, porque esse sol que nasce em
lume e que nos fere a vista, é a luz que não podemos perder. Eu pego-te na mão, áspera e cansada; mão com
mão. O sol em lume ajuda a calçada a construir as nossas formas no chão. Pego
na tua mão como se fosse para mim desconhecida. Como se fosse a primeira vez
que os teus dedos se entrelaçaram nos meus, com tanta naturalidade. Os nossos
dedos fazem parte do mesmo puzzle.
Olhamos
para o sol, de frente, como se fosse para nós desconhecido. Como se fosse a
primeira vez que o olhássemos e tivessemos a certeza de que era a luz que nos
guiava. Sinto o calor do teu amor, tão quente quanto o sol, na tua respiração
compassada que enche os meus ouvidos de carinho. Falas-me e eu guardo o som da
tua voz, como se fosse a primeira vez ou a última que a ouvisse. Depois, não
dizes mais nada. Eu não digo mais nada. Olhas para mim. Eu olho para ti, e assim
dizemos tudo.
De
mansinho, ajeitas-me o cabelo que agradece o toque dos teus dedos. Caminhamos
de frente para o sol, sempre sem medo e observamos as nossas silhuetas esguias
na calçada, que se juntam por fim num eterno abraço. Abraçamo-nos como se fosse
a primeira ou a útlima vez que o pudessemos fazer. Temos de fazer tudo como se
fosse a primeira vez.
Beijo
os teus lábios macios que me enchem de saudades quando não estás. Como se fosse
a primeira vez que os meus lábios encontraram os teus, com um aroma a mentol e
a nicotina disfarçada no ar leve de novembro, de baixo da luz de um candeeiro
de rua, colocado de propósito para fazer de cenário de tal acto. Desejava que
os teus lábios fossem sempre para mim desconhecidos para que, um dia, quando os
voltar a encontrar, os possa descobrir novamente. Como se fosse a primeira vez.
Digo
que te amo ao sabor do vento pesado que passa. Talvez ele leve o meu amor com
ele. Talvez ele te leve o meu amor num dia em que estejas só e rodeado de
saudade. Num dia em que estejamos rodeados de ninguém. Digo que te amo como se
fosse a última vez. Digo que te amo com um sorriso inocente, de quem não prevê
o futuro, pensando que a nossa caminhada durará para sempre.
Talvez um dia
consiguemos parar de caminhar de frente para o sol. Talvez um dia nos sentemos
numa sombra, pelo caminho, algures à beira da estrada. Talvez nesse momento
possamos respirar de alívio, encharcados em suor, da caminhada difícil. Talvez
aí, de frente para ti, eu possa acariciar-te o cabelo e beijar-te como se fosse
a última vez que o pudesse fazer, num beijo eterno. Talvez aí possamos ter uma
vida eterna de memórias guardadas a sete chaves com um beijo. Talvez aí o nosso
olhar se encontre, tal como na primeira vez em que nos olhámos. Talvez aí, o
nosso olhar se encontre e sorria. Talvez aí o nosso olhar se lave em lágrimas
felizes de tudo o que fizemos como se fosse a primeira ou a última vez.
Caminhávamos
sem destino certo e o silêncio no ar restava.
Gostei!
ResponderEliminar